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2015-11-09

Vida e Saúde

Mudando paradigmas no “tratamento” da obesidade.

Pessoas mais fisicamente ativas, mais felizes com seus corpos, com mais autonomia e melhor relacionamento com a alimentação. Tudo isso independentemente de alterações importantes no peso corporal. Gostou? Bem vindo à filosofia “Health at every size”, do inglês, “Saúde em todos os tamanhos”.


O inevitável fracasso das dietas restritivas por períodos prolongados é hoje muito bem documentado na literatura, estando associado ao sentimento de culpa, insatisfação com o corpo, compulsões e transtornos alimentares, os quais provavelmente explicam porque 95% das pessoas recuperam o peso perdido (veja posts anteriores sobre o assunto aqui e aqui). Durante muitos anos, nosso grupo pôde testemunhar o fracasso do "controle alimentar", termo genérico que remete à ilusão de que dietas restritivas possam ser uma solução duradoura para a obesidade. 



Diante desse quadro, a filosofia Health at every size (HAES) emerge como uma abordagem alternativa, que traz a tão esperada luz no fim do túnel para profissionais da saúde que lidam com pacientes obesos diariamente. Ela prega o encorajamento de comportamentos saudáveis para pessoas de todos os “tamanhos” corporais, sendo a perda de peso uma consequência ou não desse processo, e é pautada por cinco princípios: 



1) reconhecer que a saúde e bem-estar são multidimensionais e incluem aspectos emocionais, físicos, e intelectuais; 



2) encorajar a construção de uma imagem corporal positiva; 



3) aceitar e respeitar a diversidade de tamanhos e formatos corporais; 



4) promover uma alimentação que equilibre necessidades nutricionais individuais, além de aspectos como fome, saciedade, apetite e prazer e; 



5) promover atividades físicas prazerosas e sustentáveis.



Há cerca de 3 anos, nosso grupo, liderado pela amiga, nutricionista e professora da Faculdade de Saúde Pública da USP Fernanda Scagliusi, decidiu não somente colocar em prática, como também testar cientificamente a abordagem HAES por meio do nosso curso comunitário “Saúde e Bem Estar na Obesidade”. Neste programa, baseado na folosofia HAES, as voluntárias, durante um ano, participam de 3 sessões por semana de atividade física (supervisionada por uma equipe de professores e alunos de educação física e esporte), consultas nutricionais quinzenais (por meio da técnica chamada aconselhamento nutricional, que auxilia o indivíduo a resolver dificuldades alimentares e estimular a responsabilidade para o autocuidado, sem prescrição de dietas), além de sessões filosóficas, cujos objetivos são permitir com que as participantes construam suas próprias reflexões sobre escolhas, decisões, controle, peso e imagem corporais. Os primeiros resultados, ainda preliminares, deste programa foram super encorajadores e publicados em duas revistas científicas (referências no final do post). Vou (tentar) resumi-los aqui, exemplificando com algumas frases ditas pelas voluntárias em grupo focais.



Em termos de composição corporal, as voluntárias tiveram melhoras modestas: em média, perderam 3 Kg de peso corporal (↓3,5%), 5 Kg de gordura (↓13%) e 5,5 cm de circunferência da cintura (↓4%), e ganharam 2 Kg de massa magra (↑3,5%). Grande parte das pessoas ficaria satisfeita apenas com esses resultados. Mas os benefícios foram muito além disso. Muito mesmo. 



As voluntárias reportaram maior conexão com as sensações de fome e saciedade e escolha consciente de alimentos que levaram à melhora qualitativa da alimentação (mais almentos in natura e integrais e menos alimentos processados, por exemplo). 



“Eu reduzi bastante a quantidade de comida. Eu comia muitas barras de cereal e escolhia, vamos supor, frango, peixe e linguiça [...] e terminava com um prato enorme na minha frente. Não mais. [...]. Antes da intervenção, eu não sentia fome porque eu sempre comia muito, logo, não sentia fome nunca.", relatou uma das participantes. 



Disse outra voluntária: “Hoje eu sei que posso comer uma certa quantidade de comida e cabe a mim saber quando parar.”



As voluntárias ainda se sentiram mais impelidas a incorporar a atividade física na sua rotina, além de se sentirem mais aptas a incorporar outros tipos de atividade nas suas vidas por se sentirem mais fisicamente capazes: 



“Agora eu sempre venho para cá andando da estação de trem [...]. Eu não estava acostumada.”



 “Eu quero sair mais, aproveitar mais o que a cidade tem a oferecer.” 



Por fim, as voluntárias reportaram mudanças importantes na forma como encaram o “tratamento” da obesidade:  



Disse uma delas: “Venho mudando meus hábitos e percebi que é uma questão de saúde, não apenas de perda de peso. Agora minhas calças estão servindo, eu me sinto melhor caminhando e eu posso fazer melhor. Eu não me preocupo mais em perder peso,  eu tirei isso da minha cabeça. Sinto confiança de que isso vai funcionar e estou animada.”



“A felicidade não está na perda de peso, é uma questão de se sentir bem. Então se meu ‘sentir bem’ hoje é poder ir à faculdade, fazer minhas coisas, isso pode fazer parte da minha felicidade.”, relatou outra participante, num dos depoimentos mais marcantes.



Logo, parece sim ser possível manter-se saudável e ter boa qualidade de vida apesar do excesso de peso. Saúde e qualidade de vida  não se resumem à estética ou apena aos aspectos físicos, mas também aos aspectos psicossociais. Em tempos de terrorismo nutricional,  ditadura da beleza e, ao mesmo tempo, aumento progressivo da obesidade, a filosofia HAES vem como um sopro de esperança para mudar o tão fracassado “tratamento” convencional da obesidade, pautado pela falsa crença de que o papel central do profissional de saúde é impor um "controle" sobre o comportamento do indivíduo, ao invés de fornecer elementos para que este possa protagonizar suas próprias escolhas e estilos de vida. Essa filosofia mostra ainda a enorme importância de um grupo transdisciplinar para lidar com uma condição complexa que jamais deve ser simplificada ao peso corporal. 



Em alternativa às "mesmices" e fórmulas mágicas existentes por aí, a busca por intervenções com princípios teóricos sólidos e embasadas pela ciência é o caminho mais viável, embora não mais fácil, no cuidado da obesidade. Nossos estudos apenas se iniciaram e, em breve, teremos novas informações, que serão compartilhadas com vocês.



Fabiana Benatti - Blog Ciência inForma



www.cienciainforma.com.br



Para saber mais:



Ulian MD, Benatti FB, de Campos-Ferraz PL, Roble OJ, Unsain RF, de M Sato P, Brito BC, Murakawa KA, Modesto BT, Aburad L, Bertuzzi R, Lancha Jr AH, Gualano B, Scagliusi FB. The effects of a ‘Health at Every Size®’-based approach in obese women: a pilot-trial of the ‘Health and Wellness in Obesity’ study. Frontiers in Nutrition. 2015. In press (estará disponível em breve).   



Ulian MD, Gualano B, Benatti FB, de Campos-Ferraz PL, Roble OJ, Modesto BT, Brito BC, Murakawa KA, Torre MD, Tritto AC, Unsain RF, de M Sato P, Scagliusi FB. "Now I Can Do Better": A Study of Obese Women's Experiences Following a Nonprescriptive Nutritional Intervention. Clin Med Insights Womens Health. 2015 Sep 13;8:13-24.







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Profa. Desire Coelho, PhD
Nutricionista Clínica e Esportiva

Profa. Fabiana Benatti, PhD
Professora Doutora da Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp

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Prof. Dr. da Universidade de São Paulo

Prof. Hamilton Roschel, PhD
Prof. Dr. da Universidade de São Paulo