Vida e Saúde

Então a alimentação (e não o exercício) é a chave para combater a obesidade? Calma, muito cuidado nessa hora!

O editorial “It is time to bust the myth of physical inactivity and obesity: you cannot outrun a bad diet” recentemente publicado na revista científica British Journal of Sports Medicine gerou um frisson ao sugerir que a atividade física não é capaz de contrapor os malefícios de uma dieta ruim. Isso levou uma série de reportagens com títulos do tipo “O exercício não é a chave para o combate da obesidade”, trazendo uma série de mal-entendidos que podem ser muito perigosos para a área da saúde como um todo. Vamos à análise do editorial.

Primeiramente, percebemos que o motivo pelo qual este editorial foi escrito parece ser um ataque direto à indústria, particularmente àquela que defende que se pode consumir refrigerantes e bebidas adoçadas desde que você seja fisicamente ativo. Este ponto é interessante na medida em que o consumo elevado de bebidas industrializadas riquíssimas em açúcar parece estar diretamente relacionado ao aumento nos casos de obesidade e de doenças crônicas. De fato, as chamadas “calorias líquidas” não promovem o mesmo grau de saciedade do que as “sólidas”. Logo, alimentos líquidos ricos em açúcar e, portanto, ricos em energia, favorecem a ingestão calórica em excesso.   

Outro ponto interessante do artigo se refere ao fato de que muitos estudos mostram que exercício físico por si só não resulta em reduções substanciais de peso corporal. Já discutimos este assunto em um post anterior. Um dos pontos chave dessa discussão é o fato de que muitas pessoas facilmente compensam as calorias gastas pelo exercício físico. Outro ponto chave é que é mais “fácil” emagrecer via dieta do que via exercício. Explico: para gastar 500 Kcal eu preciso percorrer, em média, 10 Km, tarefa difícil para muitos; por outro lado, comer 500 kcal a menos por dia para quem come 2500 ou mais kcal/dia, é uma tarefa muito mais fácil. 

É por isso que muitas pessoas pregam (assim como os autores do editorial) que a dieta é mais determinante para a perda de peso do que o exercício físico. Contudo, afirmar enfaticamente que o exercício não importa no combate à obesidade é um erro mais do que gravíssimo! Um dos autores do editorial, por exemplo, afirma nesta reportagem da BBC que “Uma pessoa obesa não precisa fazer exercício para perder peso, ela apenas precisa comer menos”, prestando um verdadeiro desserviço à população. 

Vejamos então a tabela ali de cima, da figura do post, que compara os efeitos do exercício físico vs. dieta.

Reparem que embora a dieta hipocalórica possa ser eficaz na melhora de alguns parâmetros metabólicos, ela, inevitavelmente, leva à queda do gasto energético (o que dificulta e muito a manutenção do peso que se reduziu), além de levar à perda das massas óssea e muscular e ser totalmente ineficaz no aumento das capacidades físicas (força muscular e capacidade aeróbia). Por outro lado, o exercício físico não apenas leva à melhora destes parâmetros, como também estimula o ganho das massas muscular e óssea e da capacidade física. Lembremos que a capacidade física está diretamente relacionada à diminuição do risco de mortalidade independente do peso corporal!

Portanto, embora a luta contra as bebidas industrializadas ricas em açúcar seja legítima, dizer que a dieta é mais importante do que o exercício físico no combate à obesidade é, no mínimo, irresponsável! O melhor tratamento para a obesidade ainda é uma vida fisicamente ativa associada à alimentação saudável! As evidências científicas são claras, e não há por que polemizar ou confundir a população.

Até a próxima!

Fabiana Benatti - Blog Ciência Informa

www.cienciainforma.com.br

Para saber mais:

O editorial pode ser encontrado aqui: http://bjsm.bmj.com/content/early/2015/04/23/bjsports-2015-094911.full

Basu S, Yoffe P, Hills N, et al. The relationship of sugar to population-level diabetes prevalence: an econometric analysis of repeated cross-sectional data. PLoS ONE 2013;8:e57873.

Cooper R, Kuh D, Hardy R 2010 Objectively measured physical capability levels and mortality: systematic review and meta-analysis. BMJ 341:c4467.

Ross R, Bradshaw A. The future of obesity reduction: beyond weight loss. Nat Rev Endocrinol 2009; 5:319-326.

Rolls B. Dietary strategies for the prevention and treatment of obesity. Proc Nutr Soc 2010; 69(1): 70–79.