Em tempos de popularização massiva de tablets e video games aliada à crescente insegurança nas ruas das grandes cidades, é cada vez mais visível a diminuição dos níveis de atividade física praticados pelas crianças. As consequências da inatividade física são múltiplas, e muitas já foram aqui discutidas. Hoje discutiremos sobre uma forma alternativa de se promover a prática de atividade física em crianças.
Dizer que a incidência de obesidade infantil tem aumentado de maneira expressiva em todo o mundo não soa como grande novidade para a maioria dos nossos leitores. O mesmo vale para a afirmação de que a inatividade física e hábitos alimentares inadequados são os fatores que encabeçam a lista de agentes predisponentes para este aumento, deixando uma mensagem implícita sobre a necessidade de mudanças nos hábitos de vida dos pequenos.
Especificamente sobre os exercícios, é bem sabido que a recomendação de prática para melhora da composição corporal, capacidade física e melhora em parâmetros relacionados à saúde (como a pressão arterial, perfil lipídico, resistência à insulina etc) gira, tradicionalmente, ao redor de atividades de intensidade baixa à moderada e com duração acima de 30 minutos. Entretanto, esta recomendação é incompatível com o padrão de atividade física espontânea exibido por crianças, que tendem a preferir atividades intermitentes e de mais curta duração. Isto pode ser explicado tanto por fatores fisiológicos (já que as crianças têm uma percepção de esforço aumentada quando em atividade prolongada) quanto psicológicos e culturais. Basta observarmos as brincadeiras infantis. Estas, quase que invariavelmente, apresentam um padrão de movimentação de curta duração intercalados por períodos de descanso (pega-pega, amarelinha, queimada e tantas outras).
Desta forma, a discussão de hoje é sobre uma maneira alternativa de promover o aumento do nível de atividade física em crianças. Recentemente, o nosso grupo se dedicou a comparar o efeito de dois programas bastante distintos de exercício em uma população infantil com obesidade. A intervenção durou 12 semanas e, enquanto um grupo se exercitou de maneira contínua em esteira por 30-60 minutos em uma intensidade moderada, o outro realizou de 3-6 séries de 1 minuto em alta intensidade intercalados por 3 minutos de intervalo. Ao final do estudo, as duas estratégias de exercício se mostraram igualmente efetivas, já que ambos os grupos apresentaram melhoras comparáveis na capacidade física, resistência à insulina e índice de massa corpórea.
Estes resultados apontam numa direção interessante, já que parece ser possível induzir mudanças importantes na saúde de crianças a partir de modelos de atividade física menos maçantes e mais “palatáveis” para as crianças. É claro que a sugestão não é a de incluirmos rotinas de treinamento intervalado na esteira para os pequeninos - o que seria igualmente maçante; o ponto de destaque é a abstração de que é possível desenvolvermos atividades lúdicas que mimetizem o modelo testado (como jogos infantis, modalidades esportivas adaptadas (ou não), vídeo games interativos – que são, de fato uma estratégia interessante e efetiva, entre outros) para que crianças possam desfrutar dos mesmos benefícios dos modelos de exercício tradicionalmente preconizados.
Prof. Dr. Hamilton Roschel - Blog Ciência Informa
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Para saber mais: Similar health benefits of endurance and high-intensity interval training in obese children.
Corte de Araujo AC, Roschel H, Picanço AR, do Prado DM, Villares SM, de Sá Pinto AL, Gualano B. PLoS One. 2012;7(8):e42747