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2015-07-27

Exercícios

Overtraining: O que, de fato, é isso?

Sessões repetidas de treino intenso tipicamente resultam em um acúmulo de fadiga que torna a realização de um esforço considerado trivial, numa situação normal, difícil de ser realizado. - É o tal do overtraining; dirá alguém numa conversa entre amigos.


Sem dúvida este é um assunto recorrente entre praticantes e profissionais que lidam com o exercício.



Embora a maioria dos envolvidos tenha uma boa (ou alguma) ideia acerca do real significado do termo, quando estes começam a discutir as suas causas ou formas de monitoramento e prevenção, por exemplo, fica explícita a dissonância entre as opiniões. 



Em uma tradução livre, o termo pode ser entendido como “treinar demais” ou “ter treinado demais”; entretanto, no meio científico, overtraining é utilizado para descrever uma condição na qual o indivíduo apresenta uma diminuição do desempenho sem que apresente, necessariamente, uma razão óbvia que a explique. 



Esta redução no desempenho (aspecto fundamental para diagnóstico do fenômeno) vem acompanhada de uma série de sintomas que tendem a se manifestar de maneira bastante individual – o que implica que dois indivíduos sob overtraining podem não apresentar os mesmos sintomas. Fadiga subjetiva (além daquela relacionada ao desempenho), alterações de humor (como irritabilidade e depressão), alteração do sono, ocorrência de infecções, perda de apetite e redução não intencional de peso figuram entre indicadores de mais fácil monitoramento. Adicionalmente, a ciência tem buscado parâmetros fisiológicos que ajudem no diagnóstico mais preciso desta síndrome. Neste sentido, aspectos cardiovasculares como a frequência cardíaca, por exemplo, têm se mostrado úteis. Marcadores sanguíneos como a razão entre os níveis hormonais de testosterona e cortisol ou os níveis plasmáticos de creatina quinase, interleucina-6 ou glutamina, por exemplo, embora muito usados, parecem não predizer de maneira clara a ocorrência do overtraining



De maneira clara, a falta de um período e condições adequadas de recuperação são determinantes na manifestação da síndrome. Contudo, é importante elaborarmos um pouco mais (não muito, prometo!) sobre a relação entre treino, fadiga, recuperação e overtraining para que não haja confusão.



Fadiga resulta em redução do desempenho, fato! Mas isto é parte de um processo natural do treinamento e pode ser facilmente revertido com algumas horas de descanso. Fadiga severa, por outro lado, requererá alguns dias para que o indivíduo se recupere e volte a desempenhar no mesmo nível. Se este quadro se mostra exacerbado e requer muitos dias ou semanas para ser revertido, estamos falando de overreaching “funcional”. Este último é algo que pode ser planejado dentro de um programa de treinamento com vistas à melhora do desempenho. Um bom exemplo seriam os “camps” de treinamento intensificado aos quais atletas de diferentes modalidades se submetem. Estes são compostos por períodos de treinamento bastante intenso que induzem, ao seu final, um estado de overreaching com redução do desempenho. Vislumbra-se, no entanto, que após o período de recuperação, os atletas apresentem ganhos funcionais significantes. No extremo desta linha contínua de progressão da fadiga nós podemos encontrar o overtraining, do qual é muito difícil se recuperar e que assume um aspecto quase patológico ao invés de funcional. Muitas vezes, o overtraining pode significar o fim de uma temporada (ou até mesmo da carreira!) de um atleta.



Por fim, é importante entendermos que há mais na ocorrência do overtraining do que apenas o estresse físico (do treinamento). Embora o exercício seja um fator estressor para o organismo, não podemos descartar o papel do estresse relacionado ao trabalho, família, demais jogadores do time, pressão pelo desempenho, patrocinadores etc. O corpo tem que lidar com tudo isso! Embora o overtraining seja algo mais característico do esporte e, assim, ligado a atletas de elite, imagino que muitos podem se relacionar com o seguinte quadro:



Você vem treinando de maneira consistente há um bom período de tempo e está acostumado a desempenhar em um certo nível. Em uma determinada época do ano, o estresse do trabalho aumenta (período de fechamento na empresa, por exemplo). Rotina intensa no escritório, uma pior alimentação e menos horas de sono (e você continua mandando bala nos treinos) quando não mais do que de repente aquele treino que lhe parecia tão trivial agora parece tão pesado e impossível de ser completado... você resolve tirar uns dias de folga da academia e quando volta o seu desempenho está restabelecido. 



Já viu isso antes?



Isso mostra o quão multifatorial é o fenômeno e o quão difícil é monitorar isso tudo. Embora a ciência esteja prestando muita atenção neste assunto, a notícia amarga é que ainda não há formas de monitoramento boas o suficiente para garantirmos um controle adequado sobre este processo. Um bom planejamento do treinamento e aporte nutricional adequados são alicerces fundamentais para o sucesso. Contudo, é importante entendermos a característica holística do indivíduo e estarmos atentos para o que mais nos envolve.



Até mais,



Prof. Dr. Hamilton Roschel - Blog Ciência inForma



www.cienciainforma.com.br



 



Sugestões de leitura:



-Meeusen R, Duclos M, Foster C, Fry A, Gleeson M, Nieman D, Raglin J, Rietjens G, Steinacker J, Urhausen A; European College of Sport Science; American College of Sports Medicine. Prevention, diagnosis, and treatment of the overtraining syndrome: joint consensus statement of the European College of Sport Science and the American College of Sports Medicine. Med Sci Sports Exerc. 2013 Jan;45(1):186-205. 





-Halson SL, Jeukendrup AE. Does overtraining exist? An analysis of overreaching and overtraining research. Sports Med. 2004; 34(14):967-81. Review.







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Profa. Desire Coelho, PhD
Nutricionista Clínica e Esportiva

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Professora Doutora da Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp

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Prof. Dr. da Universidade de São Paulo

Prof. Hamilton Roschel, PhD
Prof. Dr. da Universidade de São Paulo